sábado, 21 de abril de 2012

(Season 1) Cap. 02 - Ingrid



“Difícil era ter que ficar em casa. O nível do meu relacionamento familiar poderia ser qualificado como saturado.”



“Imaginei que algo novo havia acontecido ao encontrar minha mãe distraída na cozinha a ponto de não atender a minha terceira chamada, dessa vez eu estava quase gritando e esta ainda encarava o mármore da bancada como se uma hora pudesse encontrar alguma resposta nele.”



 “Não sei dizer ao certo quando foi que minha família se tornou lixo.”



Ingrid desistiu de suas chamadas a distancia, aproximou-se e tocou o ombro de sua mãe que se virou em um pulo de susto.

- Mãe, estou te chamando a alguns minutos... Tudo bem?
- Perdão Ingrid, não estava prestando atenção.
- Eu fui capaz de perceber! Você não me respondeu, aconteceu alguma coisa?



 - Não! Está tudo certo, querida! Você vai sair?
- Sim, vou pra casa do Chaaz. Devo passar a noite lá, ok?
- Ok, se divirta e volte cedo. – A última frase de Carmen, mãe de Ingrid, a denunciou. “Se divirta e volte cedo” não é um conselho apropriado para uma filha que pretende dormir na casa de um amigo; definitivamente esta não havia prestado atenção na resposta.


 - Tchau, mãe...  – Era normal não receber atenção, mas dessa vez Ingrid sabia que, cedo ou tarde, o motivo da desatenção de sua mãe a causaria problemas.  Era possível imaginar o nome do problema, “Aron” é claro.



 A certeza veio à tona quando o encontrou escorado na porta de casa as seis da tarde. Nunca estava presente e quando estava, causava problemas.
- O que faz em casa tão cedo?
- Mais uma festa dos seus amigos escrotos, Ingrid? Vai acabar sendo internada em uma clínica de reabilitação.



 - Escuta, Aron.... – Escorou-se no detalhe lateral da porta para que fosse possível pressioná-lo de alguma forma – O único ser vivo nesta casa que logo vai parar em uma clínica como esta é você. Sei bem o que você faz e por onde anda.

- E você não faz nada disso, não é?





Na casa de Chaaz tudo corria normalmente, um pouco mais desanimado do que de costume. O “grupo” estava desunido, nutriam-se de indiretas ou alfinetadas.
Jogados ao sofá, única mobilha deixada no ambiente projetado para a festa, fumavam e bebiam a espera de Ingrid, que demorava mais do que o normal naquele dia. A esperança de que o animo melhorasse com sua chegada era falsa, só precisavam esperar por algo.



O clima entre Simon e Kitty não poderia ser pior, aliás, poderia sim afinal Chaaz estava dividindo o mesmo ambiente, sentado entre os dois, ouvindo os resmungos e similares que soltavam de segundo em segundo.


Os convidados se divertiam como se nada estivesse acontecendo, a música estava alta a ponto de Chaaz temer os vizinhos e seus telefonemas, mas lembrou-se de que a maioria já havia desistido de interferir nas festas do local. Seus pais viajavam toda semana pela companhia de viagens turísticas em que trabalhavam. Pode soar estranho, mas Chaaz gostava de observar pessoas se divertindo e sempre que lhe era viável, promovia tais festas.


 - Ela não vem.
- Calma, Kitts, só passou meia hora de festa. Aposto que ela estava pintando o cabelo.
- Bitch.


A agonia de Kitty chegou ao fim assim que Ingrid finalmente atravessou a porta, chamando a atenção de alguns conhecidos que a cumprimentaram brevemente com acenos e sorrisos bêbados.



 - Ingrid! Onde você estava!? Nem veio ajudar a arrumar a casa antes...- Kitty despencou frases em Ingrid que logo a cortou.
- Relaaaxa, Kitty! – Prolongou em tom sarcástico – Quase morreu de tanta saudade?
- Eu deveria lhe dar uma bifa, maldita!
- Ai Kitty, que escarcéu! Só demorei pra escolher uma roupa. – Mentiu.


- Nunca vi uma “Chaaz Party” tão desanimada...
- Claro, eu não estava aqui. Vocês não sabem fazer NADA sem mim, não é?

Riram e dançaram juntas ao ritmo da música que ambas conheciam, imitaram cenas do clipe sem nenhuma vergonha, nenhum ser presente seria capaz de se lembrar de algo no dia seguinte.



Chaaz surgiu entre as duas em um salto que deu do sofá, prometendo a si mesmo uma possível animação.

- Ingrid, finalmente! Vou pegar uma cerveja pra você, ok?
- Nada além da sua obrigação, anfitrião.




- Gata, vou seguir o Chaaz pra pegar a chave do banheiro e usar antes que alguém vomite nele, ok?
- Tsc, ok. Implorou tanto por minha presença... Então que vá rápido!
- Ok, Ingrid, ok.




- E onde você vai, Mr. Simon?
- Quero falar com a Kitty.
- Acha MESMO que é uma ideia inteligente?
- Acho.



- Simon, a Kitty não quer nem ver seu rosto. É melhor esperar uns dias e...
- E o que? Eu queria que estivesse no meu lugar, Ingrid, só assim iria entender. Ela não me explicou o porquê disso, não vou me conformar.
- Você nunca se conforma. 


 - Até depois, Ingrid... Aproveite a festa e tente cuidar da sua vida por algumas horas. Kitty sabe se cuidar sozinha. – Finalizou Simon enquanto ultrapassava Ingrid quase forçadamente para se direcionar a sala de estar, onde provavelmente encontraria Kitty subindo as escadas.



Dito e feito, lá estava ela que se virou ao ouvir a voz grave de Simon chamando por seu nome. Alguns raios de sol começavam a surgir pelos vidros das janelas da casa de Chaaz, assim como alguns convidados já estavam jogados pelo chão.

- Oque você quer, Simon? – A voz de Kitty soou cansada, suspirou antes e depois de pronunciar-se.




- Você é mesmo muito ingrata, Kitty. – Apontou
- Ingrata porque? – Gesticulou com as mãos alegando ser um adjetivo absurdo, apesar de saber bem do que se tratava – Simon, supere o fim desse namoro ou não poderemos estar no mesmo ambiente a partir de agora!
- Eu poderia superar se você me contasse o porque disso! Mas que merda, Kitty, para de enrolar como se isso fosse uma novela, diz logo o que tanto te incomoda!





O silêncio reinou enquanto ambos procuravam palavras para continuar a discussão, a gritaria acordou a garota antes jogada ao chão, agora o único som na sala vinha de murmúrios desta reclamando a dor de cabeça.




Assim que ficaram a sós, Simon não soube controlar bem seus movimentos e deixou que seus braços enlaçassem Kitty contra a parede.

- Kitts, não me deixa desse jeito. – Cuspidas e emboladas são bons adjetivos para as palavras que, com muita dificuldade, saíram da boca de Simon.



- Simon... Me larga, vai. Eu já te deixei, é tarde demais pra tentar ser alguém diferente, você deveria ter agido assim antes.



- Antes do que!? – Mais uma vez, perdera a noção de seus movimentos. Sentiu uma raiva imensurável por mais uma vez estar em se perguntando sobre o que realmente aconteceu. Não podia cogitar a ideia de existir “outro” ou ficaria cada vez mais agressivo. Não era de seu feitio agir de tal forma, apesar de ser descontrolado e infantil; Kitty sentiu seu corpo trêmulo, seu pulso que Simon firmava contra a parede parecia queimar com o toque, não saberia dizer ao certo se seriam sintomas de um possível “porre” ou se realmente estava muito assustada.




- Eu não amo você. – De imediato, Kitty sentiu as mãos de Simon soltando seu pulso após terminar sua frase já arrependida. Estava certa de não sentir mais nada por Simon, mas sua ação foi completamente impulsiva, movida pelo ódio de estar presa naquela parede.




- O que está acontecendo aqui...? – A voz de Chaaz, suave como de costume, fez com que Simon e Kitty voltassem para a realidade onde uma festa estava terminando. Principalmente Simon.




Em um movimente um tanto desengonçado, Kitty livrou-se de Simon sem dificuldades. Correu em direção a Chaaz sem muita noção do que estava fazendo, só precisava estar com alguém que não fosse seu ex-namorado, julgado como psicótico por esta.




- O que aconteceu, Kitts? Você está bem? – Abraçaram-se com força pelo impacto do encontro. O cigarro ainda aceso entre os dedos de Kitty caiu, Chaaz nem se deu conta de que a casa poderia incinerar-se por isso ou que simplesmente sua mãe pudesse incinerá-lo por um buraco na tapeçaria, estava atendo a cada suspiro choroso da garota que escondia o rosto em seu ombro.




Simon saiu da sala em passos largos, passou por Ingrid ao chegar ao hall e, involuntariamente a empurrou para abrir passagem.

- Ei! Que merda é essa, Simon? Ficou maluco, é? – Indagou indignada.



Sua intenção era sair dali o mais rápido possível, mas foi vetado por Ingrid que não aceitou levar um empurrão sem motivos.

- Simon, espera! O que está acontecendo aqui, cretino?
- Ingrid, vá se ferrar... Me deixa em paz, ok?
- Eu disse que não seria uma boa ideia!





A porta se abriu novamente, Kitty e Chaaz saíram desta, porém Kitty avançou alguns passos para não ter que encarar Simon novamente.

- Chaaz, Ingrid, sinto muito por isso, mas estou indo pra casa. Eu volto pra ajudar a limpar a casa depois, ok? – Despediu-se.



Assim que se virou para descer as escadas de pedra, sua expressão se transformou de forma cômica. Esperava qualquer coisa naquele momento, menos um garoto loiro sentado a beira da mureta.

- R-R-Rupert!? – Gaguejou. Não havia uma explicação correta para seu espanto, estava assustada e queria correr para seu quarto o mais rápido possível, mas o destino fez questão de zombar de seus planos.


Os olhares curiosos dos outros três a comeram viva por segundos. Mais uma vez mudara sua expressão repentinamente, agora fazia sua provável pose de determinação mais bem efetuada de todos os tempos!



Kitty desceu as escadas apressadamente. Ingrid moveu seus olhos imediatamente para Simon, que parecia completamente perdido, porém atento e a preocupação de Chaaz aumentou em níveis estressantes.



Em sua ação mais impulsiva, Kitty jogou-se contra o corpo de Rupert que ao segurá-la com uma probabilidade alta de caírem, acabou por levantar o corpo da garota em seus braços do chão. Durante toda essa ação, Kitty grudou os lábios  com forma em um beijo desesperado e estranho.


A única que conseguiu se mover foi Ingrid, mas em uma ação nada relevante, apenas censurou a própria boca antes que soltasse um de seus piores palavrões para situações de choque.




Kitty pousou os pés no chão em dois sentidos: o figurativo por estar envolvida no beijo por longos segundos e o real por estar realmente erguida pelos braços de Rupert. Uma lágrima teimou em cair pelo canto de seu olho, o choro era desesperado em meio a situação em que se envolvera.


- Kitty? – Finalmente Rupert teve a oportunidade de falar – O que... Houve? Esperai... Você está chorando?


Não suportando mais estar ali, Kitty correu na velocidade máxima que lhe era viável. Realmente não estava calculando suas ações de forma lúcida, mal chegou a pensar nas consequências e sentiu o vento arrancar o restante das lágrimas que agora corriam em seu rosto, embaçando seu óculos com “armação gatinho”.



O choque da plateia mudou de foco quando uma gargalhada estridente ecoou pela rua. Vinha de Simon que preferiu rir a qualquer outra coisa. Em seus pensamentos, acreditava ter descoberto o real motivo pelo qual Kitty quis terminar o namoro. Havia um “outro cara em jogada”, e como foi dito a alguns parágrafos atrás, era óbvio que ficaria mais agressivo do que o de costume, por isso os olhares de Chaaz e Ingrid o rondavam preocupados com os próximos acontecimentos.





Terminou a gargalhada com um “ai, ai” em tom irônico enquanto descia as escadas. Rupert não entendia definitivamente nada, só se manteve de pé porque, assim que pode, Simon fixou seu olhar sem chances de escapatória.



- Ok... Você é o namorado dela, não é? – Pergunta errada. A inconveniência das palavras de Rupert fez com que Simon tivesse certeza de sua hipótese de traição.
- Então você é a Barbie?



- Oque...!? – Cada vez mais perdido, nem foi capaz de entender o insulto de Simon sobre seus cabelos extremamente loiros.
- É, meu irmão... – Agora Simon possuía um sorriso irônico que esboçou ao colocar a palma de suas mãos sobre o peito de Rupert, agarrando o tecido de sua camisa para mantê-lo imóvel.


E obviamente, projetou um soco no rosto de Rupert, estalando cada osso de sua mandíbula. Simon tinha afeição por pegar pessoas desprevenidas.  Duas marcas surgiram, uma no rosto de Rupert e outra no punho de Simon.




 - É sempre a mesma coisa.
- Na verdade, Chaaz, dessa vez é diferente. É a primeira vez que Simon tem razão.
- Quem é esse cara estranho, Ingrid?
- Não faço a mínima ideia. Esse é o problema.


Durante o breve diálogo de Ingrid e Chaaz, Rupert debruçou-se sobre a mureta na qual estava sentado anteriormente e tossiu algumas gotículas de sangue que foram arrancadas da parte interna de sua boca pelos próprios dentes.
Simon já havia dado as costas para os três e caminhava para casa com um sorriso confuso no rosto. 


Ingrid não esperou muito para inventar uma desculpa qualquer e começar a descer os degraus da casa de Chaaz que queria reclamar sobre a limpeza da casa, mas não teve coragem.

- Eu volto mais tarde pra te ajudar a limpar isso, ok? – Despediu-se.
- Ok. Até mais, Ingrid! – Conformou-se.


Rupert não recebeu nem um segundo de atenção após o golpe. Simon, definitivamente, o pegou de surpresa, não houve tempo para revidar. Sendo assim, acendeu outro cigarro e o amargurou ali mesmo.


Amanhecera cedo naquele dia, Ingrid caminhava pelo passeio e ao escutar sons estranhos vindo de sua própria casa, não acelerou o passo. Era normal chegar e encontrar o resto do que chamava de família em guerra.


 Mas, dessa vez assustou-se de uma forma nova ao contornar a parede da cozinha. Franziu a expressão imediatamente ao perceber que a situação estava piorando.


 - Não vou admitir que me acuse desse jeito, enquanto você não acreditar em mim, não te solto! – Foram as primeiras palavras que Ingrid ouviu.
- Eu já disse que acredito em você, meu filho...
- Então porque estava revirando minhas coisas!? 



- Larga ela, Aron. – Disse em tom firme, porém forçado. Ingrid tinha personalidade forte, mas algumas situações a tornavam vulnerável. Só o fato de Carmen, sua mãe, estar envolvida já era o suficiente para deixá-la nervosa e sem reações.




- Aron, pare com isso. Sua irmã está aqui, vamos finalizar este assunto, está bem?
- Então você não andou fofocando sobre isso com sua Ingrid? Se ela não sabe eu posso contar que você está me acusando de roubar suas coisas!




- Roubar? – Tentou pela segunda vez ressaltar a voz entre as outras do cômodo.
- Isso mesmo. Como se eu precisasse de algo vindo de vocês duas.




- Mãe? – Ingrid direcionou-se a sua mãe, esperando por uma explicação. Detestava ter que esperar por uma resposta. Suas conversas eram sempre diretas.
- Ingrid, vá para seu quarto, por favor. – Carmen tentou afastar sua filha mais nova da discussão. Apesar do declínio familiar, já fora muito ligada a Ingrid, essa ligação não havia acabado por completo pelo simples fato ainda de usarem os colares iguais que compraram juntas cinco anos atrás.



- E porque você me acusa sem antes pensar que pode ter sido a Ingrid!? – Aron voltava ao tom de voz alto o suficiente para fazer Carmen cerrar os olhos – Ela não é diferente de mim, mãe, faz as mesmas merdas que eu, pode muito bem ter roubado suas joias para investir nas festas entorpecentes que faz com os amiguinhos!



Foi então que chegou ao seu limite. Correu para fora de casa, bateu a porta e escorou-se na mesma escondendo o rosto de si mesma. Aron não estava mentindo. Ingrid estava envolvida com drogas assim como o resto do grupo, de uma forma sutil e quase nula, mas estava. Não havia argumentos para negar a acusação de seu irmão. 




Quando parou de pensar e percebeu os próprios movimentos, estava a procura de algum número na agenda. Passou por “Kitty”, mas não sentiu vontade de chamá-la daquela vez, não seria de grande ajuda levando-se em consideração a força de Aron, apesar deste não ser o motivo exato; Ingrid chateou-se ao perceber que sua melhor amiga poderia estar escondendo uma possível traição e julgou rigidamente já que prometeram nunca manter segredos.



Nem chegou a pensar em Chaaz, apesar de ser o melhor ombro amigo que alguém poderia ter, não correspondia o requisito “força” da forma necessária. Sua única alternativa caminhava pela praça, ainda desconcertado pelos últimos acontecimentos, quando recebeu a ligação.


- Ingrid? – Respondeu Simon após ouvir murmúrios ao invés da voz acelerada que esperava – O que houve...? Ingrid!? Responde, merda!



Levou alguns minutos até que Simon surgisse desistente a porta de Ingrid. A encontrou sentada no chão, mas sua atenção se voltou para o barulho vindo de dentro da casa, sons de cadeiras e objetos similares sendo jogados contra o chão.

- Será que dá pra você dizer logo o que está acontecendo, Ingrid? Seu irmão outra vez, certo?
Simon não se tornou uma alternativa de ajuda só por eliminação. Já havia ajudado Ingrid nas diversas vezes em que seu irmão descontava problemas pessoas em Carmen.
 - Dessa vez eu não sei o que fazer, Simon. – Desabafou com a voz trêmula de raiva. Chorava por não conseguir resolver seus problemas sozinha como sempre fez. Odiava-se por ter que pedir ajuda.




- Estão quebrando tudo lá dentro, Ingrid?
- O que você acha?
- Porque isso dessa vez? O que houve?
- Simon, ajude minha mãe. Aron vai acabar fazendo o que não deve lá dentro.




Depois de resmungar algumas palavras, Simon se levando em um pulo, abriu a porta e entrou sem mais delongas. Encontrou ali, uma forma de descontar sua raiva em alguém.

- O-onde você vai, Simon?
- Resolver, ué. Dona Carmen não tem que passar por isso.





Em sua melhor estratégia, usada alguns minutos atrás, Simon entrou na cozinha já desfigurada pela discussão em passos rápidos. Caminhava em direção a Aron sem hesitar enquanto ouvia algumas provocações do mesmo.



Assim que ficou próximo o suficiente, encaixou seu pé direito com o máximo de força que pode no peitoral de Aron. Foi difícil derrubá-lo usando tal movimento, mas a paciência de Simon estava em seu limite. Não quis trocar palavras e muito menos saber o que estava acontecendo, foi a única forma que encontrou de calar a boca do irmão de Ingrid para que pudesse logo sair dali.



O que mais assustou Carmen e Ingrid foi o estrondo gerado pela mesa caindo por cima das cadeiras assim que recebeu o peso de Aron. Mal tiveram tempo de assimilar o que realmente estava acontecendo.




Carmen estava imóvel. Manteu-se encolhida e não disse nada, não fazia ideia de quem era o garoto que acabara de derrubar seu filho sobre a mesa de jantar, bagunçando por completo a cozinha. No fundo, agradeceu por este ter aparecido.




- “Vambora” Ingrid. Deixe que resolvam agora, não é problema seu. – Finalizou Simon.
- Mas... Mas! – A voz de Ingrid soou cômica, não podia acreditar na situação. Jurou que veria Simon discutir e, provavelmente, bater em Aron, mas de forma sutil. Todo aconteceu tão rápido a ponto de perceber que a exagerou ao julgar a situação critica. Os ataques de ego de seu irmão eram comuns, não havia motivos para chorar, secou rapidamente as lágrimas em seu rosto e seguiu Simon.




Involuntariamente caminharam para o quarto de Ingrid. Não fazia sentido sair de casa, a manhã ainda não havia chegado por completo e não encontrariam nem uma loja de conveniências aberta, nem para comprar cigarros.
Simon sentou-se a beira da cama e, por mais que pudesse parecer estranho, Ingrid aninhou-se em seu colo procurando organizar as últimas cenas em sua cabeça novamente, no intuito de tentar acreditar. Seria uma forma de dizer “obrigada”, já que era muito orgulhosa para tal.





- Simon... – Levantou-se após perceber o que realmente estava fazendo. – Você está bem? – Desviou o assunto para desinibir a situação.
- Eu não sei de mais nada.
- O que houve lá na casa do Chaaz?
- Mesmo se eu soubesse, Ingrid, não ia querer falar sobre.



- Quem era aquele cara, Simon?
- Não precisa atuar. É claro que você já sabia que a Kitty estava me traindo com uma Barbie fumante.
- Dessa vez eu realmente não sabia de nada! Mas se não quiser acreditar o problema é seu, Simon...



- “Dessa vez”? Que merda é essa, Ingrid? Vai dizer agora que ela já me traiu outras vezes? – A única modificação expressiva de Simon foi uma das sobrancelhas erguidas. Estava completamente calmo agora, foi realmente muito efetivo descontar a raiva em Aron.




- Não. Ela não traiu. Mas isso é o que eu acho. Agora que ela mentiu sobre isso não posso dar certeza. Achei que ela me contaria tudo... – O abraçou enquanto terminava a frase, em um ato de amizade, tentando consolá-lo de alguma forma, sendo também outra forma de agradecer pela ajuda com Aron.

Ficaram assim por um tempo. Simon preferiu ficar em silêncio, estava se sentindo idiota e derrotado demais para dizer alguma qualquer coisa.


Movimentos estranhos começaram a surgir ali quando começaram a afastar o corpo. Os braços não se soltaram por completo e, em uma ação completamente involuntária, Ingrid tocou os lábios de Simon com o dedo indicador, contornando o mesmo como se os visse de uma forma diferente naquele momento.


- O que diabos você está fazendo? – Simon perguntou com palavras emboladas, quase sussurrando pelo fato de sua boca estar impedida pelo toque do dedo de Ingrid.
- Não sei. Fica quieto, ok? 



Simon não pode atender ao pedido de Ingrid, estavam se aproximando como se estivessem sendo obrigados a isto. Algo os atraiu de forma irresistível.  Existiam algumas explicações plausíveis... Ambos sentiam raiva de Kitty no momento, o remorso detonava cada intenção, mas mesmo assim, não foram capazes de parar.

- É melhor parar com isso.  – Simon cantarolou esta frase e pareceu falar para si mesmo.




Sabia que era tarde demais, assim que a última palavra saiu de sua boca, já pode sentir a de Ingrid. Só era bom por ser “errado”.



Em uma tentativa de pular uma etapa, caminharam juntos até a cama ainda com os lábios colados, mas acabaram caindo de forma desastrosa na mesma. Riram por alguns segundos da perda de equilíbrio que poderia ter resultado em um tombo drástico.


- Desculpa aí...
- Desde que minha mãe não tenha ouvido o barulho da cama batendo no chão, tudo bem.



A situação tendia a piorar. Enquanto riam do pseudo tombo, Simon se aproximou mais,  não estava tentando resistir, não havia sequer um motivo para se limitar.




Ingrid estava imóvel, sentia calafrios pelas ações de Simon e, diferente do mesmo, não tinha a intenção de deixar isso acontecer tão facilmente. Por dois simples motivos: o garoto deitado por cima de seu corpo era o ex-namorado da sua melhor amiga e, claro, porque ela não era “tão fácil assim”, como mentalizou para tentar sair debaixo de Simon.




- Chega. – Impôs Ingrid após um movimento rápido que cortou seja lá o que estava acontecendo ali.
- Qual é, Ingrid...?
- “Qual é” merda nenhuma, Simon, cai fora!




- Tá, ué. Eu vou.  – Levantou e deu passos largos pra trás com a cara mais deslavada que tinha, seu tom irônico estava sendo usado por saber muito bem Ingrid estava se esforçando muito para resistir.
- O que foi? Vai ficar convencido agora?
- Porque ficaria? Você vai, me beija, deixa que eu te jogue na cama, e agora... Agora me manda ir pra casa como se fosse um cachorro – Dramatizou – Não há nada do que eu possa me gabar aí!
- Besta. Sai já do meu quarto, Simon. Falo sério agora.




Desceram para o andar inferior ainda trocando algumas indiretas e, por fim, rindo da situação.

- Parece que o problema foi resolvido, né? – Comentou Simon após perceber a ausência de Aron.
- É, parece que sim. 



- Então... – Antes que pudesse se pronunciar novamente, fora cortado por Ingrid que se impôs apontando o dedo e franzindo a expressão ao máximo que pode.
- “Então” nada. Nada aconteceu, nada será comentado.
- Era exatamente isso que eu ia propor.
- Que bom. Mais uma vez obrigada pela ajuda e tchau.



Não houve mais troca de palavras, apenas acenos. Assim que saiu, Simon percebeu que Aron estava escorado a mureta, parecia estar esperando por ele.

- Acha que estar dormindo com minha irmã vai te livrar de alguma coisa?
- Não.
- Então é bom que se prepare.
Simon riu sem humor, sabia que Aron poderia ser perigoso caso estivesse acompanhado, mas sozinho, não teria chance.
- A hora que você quiser revidar isso, é só me procurar, só tente não descontar em sua mãe por medo de apanhar outra vez.



Se a porta da casa de Ingrid não estivesse onde estava, esta teria ido ao chão com grande facilidade naquele momento. Escorada ali, refletiu sobre tudo que poderia acontecer nos próximos dias e, imediatamente, levou a mão a testa por sentir dor de cabeça somente por imaginar.